Republicação seleta (e levemente aperfeiçoada) dos textos de eutenhoumblog.blogger.com.br, blog que mantive dos 16 aos 19 anos, de 2003 a 2006. A ideia é que a repostagem seja na mesma data anterior (dia e mês, apenas dez anos depois). Nos comentários, eu falo do que me lembro da época em que escrevi, e avanço. Pra que o meu eu de então fique contente.

domingo, 30 de março de 2014

O que é isso, companheiro?, o livro, de Fernando Gabeira

Tem uns livros, uns filmes, que me mudam a visão de certas coisas. O golpe de 64, pra mim, foi coisa rápida. Alguém subiu num palanque, disse coisa parecida com "agora vocês tão fudidos" e estava feito. Pra mim, os atos constitucionais tinham sido um após o outro, e os Generais puseram a Nação de quatro rápido e sem volta. 

Mas não, nem foi assim. 

A coisa foi bem mais lenta. Os estudantes se rebelavam, os socialistas se rebelavam, alguns dentro do exército se rebelavam. Greves, demonstrações. Alguns furavam as greves, armas que deveriam chegar não chegaram. Alguém ia trazer um docinho pra festa e, pluf, o docinho caiu. Pena. 

E há algumas realidades: como, pouco a pouco o Brasil perdia a chance de mudar qualquer coisa que fosse; os que se rebelavam no começo foram reduzidos a eles mesmos, presos na batalha que criaram. Pelos outros. Outros que nem se importavam: falei em mudar visão? Não esqueço tão cedo do grupo revolucionário lá preparando uma demonstração enquanto as pessoas corriam, apressadas, para garantir seu presente de Natal. 

Outra realidade? Esta mesmo, dos socialistas, comunistas, messiânicos, vou-mudar-a-sua-vida-dê-me-sua-mão-agora da vida. Que tinham de se reafirmar que estavam sempre avançando, de que o capitalismo era culpado e que estava caindo. Sempre. Crer que o proletariado se importava com a causa deles, de que se levantariam em armas. Mas não se levantaram. 

Brasil, país controlado pelo capitalismo, pelos EUA. Tanto é que sequestraram o embaixador deles. Paranoia? E, ainda mais uma realidade: a dos brasileiros que se orgulhavam dos revolucionários — essa é, anh, engraçada — "Eles são uns caras legais. São meus ídolos", mas lutar com eles, por eles, pela mesma causa? Nem pensar. 

Ao menos, penso que conseguiram mudar meio passo que seja. Todos os torturados, com toda a eficácia de 1984 e toda a crueldade de, anh, A Paixão de Cristo. Todos nós, brasileiros, orgulhosos de nosso estado, concordamos no que devemos fazer, né? Dar-lhes um feriado, esquecer o motivo do feriado e fazer um churrasco. 

Ou, quem sabe, vender ovos de páscoa.

sexta-feira, 28 de março de 2014

das pessoas que não amo.

Ela tem daqueles olhos que não tem cor que traga interesse, sabe como é? Os meio que pretos, sem chegar a ser castanho. O cabelo dela, agora que parei pra pensar, acho que quer se fazer de vermelho, mas de um tom de ferrugem não passa. Não, ela não é boa com cores, é o que concluo. 

Mas o título é forte por demais, não dá pra continuar. Das pessoas que não amo, não das que eu odeio ou desgosto. Não um 'não amo' de não amar mesmo, com intensidade. Bem mais descansado. Sou eu olhando de beira de estrada pra beleza de árvore caída. 

Voltemos a ela, então. 

Ela fica quieta bastante tempo, fala quando falam com ela. Pessoas chatas essas que fazem assim, mas essa chatice dela até que se releva. Alguém pode pensar que esse "deixe estar" é um estratagema de quem não quer vê-la aos papos com meio mundo, não é, mas pode até ser. E ela também é confusa quando fala, complicada toda ela: afirma algo, volta e diz o contrário. Complicada, toda ela. 

Mas até que fala, e quando fala, pergunta questão que perturba. Esperta toda ela, lança um fato, eu, néscio que sou, nego, ela tem o que quer em mãos. Fez-me uma vez a mesma coisa, peguei-a no ato — esperto todo eu. Burro, mas burro experiente. Não é pouca merda, não. 

E nessa de dizer o que não é, me descreve como aquilo que finjo que não sou. A máscara funciona bem, obrigado — ou pelo menos me parece, vai ver que nem engana ninguém e não é como penso: que ela vê por debaixo da tal máscara, sem esforço que se veja. 

E, de tudo isso, tiro o quê que preste mais que tantas horas? Billy Corgan que me empreste seus versos: what have you got when you feel the same? Mais do mesmo, mesmo que seja algo aprazível, fica sendo menos aprazível só por ser repetido. Mas que Billy Corgan me empreste o nome de sua música, pensamento me diz que a moça deste texto se parece: bala com asas de borboleta. 

Vai perder velocidade, vai cair, vai ferir, sangue, ossos, dor, cicatrização. Mas vem com asas de borboleta. Tão bonito. Beleza de relógio parado quando acerta a hora, da árvore lá de cima, morta, arrancada. Beleza da bala. Beleza dela, ela, toda bela.

segunda-feira, 24 de março de 2014

Macunaíma, de Mário de Andrade

Macunaíma foi diferente de tudo o mais que eu já tinha lido; acho que entendi o Modernismo alí, quando li. Pois o Modernismo queria romper com Romantismo Classicismo Parnasianismo Realismo, todas essas coisas literárias. É um nonsense meio que complexo. Só meio. 

A história é simples por demais. É Macunaíma, o herói sem caráter (dita essência do brasileiro: não ter caráter), que sai de sua casa, acompanhado de seus irmãos, Jiguê e Maanape. Jiguê era muito bobo. Maanape era feiticeiro. 

Então, Macunaíma briga, brinca e se amulhera com a Mãe do Mato. 

A cunhã Mãe do Mato morre, dá muiraquitã pra Macunaíma, Macunaíma perde muiraquitã. E vai buscar, em São Paulo. Deixa sua consciência escondida num canto e vai buscar, com um tal de Venceslau Pietro Pierra, o gigante comedor de gente. Em São Paulo. 

E Macunaíma faz bastante coisa. Macumba casos contados origens de coisas fugas mortes preguiças brincadeiras com cunhãs, todas essas coisas que se dá pra fazer. Ele e os irmãos dele, Jiguê e Maanape. Jiguê era muito bobo. Maanape era feiticeiro. Macunaíma era muito fedido, e por conta disso que acabou sendo difundido o "vá tomar banho!". E a Lua tem partes pretas por conta de sopapos do herói, e o Sol é amarelo por conta de ovo jogado. 

E isso aí e mais um pouco. Como ele diz, o herói, "Ah...que preguiça", de contar o resto. 

Tem mais não.

O Pagamento

Não sei o que me aconteceu, mas houve um momento em que parei de gostar de filmes de ação. Anh, eu realmente gostava de ver as pessoas se matando, ver as moças sendo salvas, ver os inimigos atirando em todos os lugares possíveis do cenário, exceto nos heróis. 

Mas, que seja, o diretor era o de Missão Impossível 2 e a história é do mesmo cara de Minority Report e O Vingador do Futuro; e é ai que você vê a diferença em uma produção de Steven Spielberg — Minority Report pode ser um filme com ação, mas é muito mais sua história. Em O Pagamento acontece o contrário, e ainda uma ação frouxa. 

Bom, há os engenheiros reversos. Basicamente, eles descobrem a tecnologia de um produto desmontando-o e o refazem (acabei de notar que os geneticistas poderiam ser assim chamados). O engenheiro protagonista faz os serviços e então apagam a memória dele; ele nunca fez coisa alguma, e ninguém pode arrancar isso dele. Certo: a vida dele é feita de momentos, e ele é feliz. 

Então ele arranja um emprego realmente importante. Três anos de serviço, três anos a menos da sua vida, noventa milhões de dólares na sua conta. Mas, quando ele acorda depois do serviço feito, descobre que ele havia trocado todo o dinheiro por vinte itens aparentemente inúteis. 

O resto são coisas que se encontra em qualquer filme por aí. 

Não leia o que segue se realmente se não quer ter revelação alguma: Anh, ele tem ainda um ponto científico, cerca de dez segundos do filme: a máquina que ele reconstruiu podia ver o futuro, graças a alguns satélites com lentes super-potentes que viam a curva do Universo — diz a lenda que se você olha pruma curva infinita, acaba vendo suas costas. 

Possível?

sexta-feira, 21 de março de 2014

Operação Ovo de Páscoa

"...e por não saber que era impossível, ele foi lá e fez". Costuma ser assim. Lá está o cara, ele faz uma porção de coisas, vence um império e talz, e aí, no dia em que ele morre, pagando por suas ações, resolvem vender ovos de chocolate. Posso ver um coelho branco, o mesmo de Alice, ainda apressado, com uma cartola negra na cabeça, nas mãos manchadas de vermelho uma corda, na extremidade da corda, em forma de laço, a cabeça de um homem. 

Jesus, dito Cristo. 

Não, não caia em questão de religião, assim me faz um favor. O assunto aqui não é religião. Não quero endeusar ninguém; "Sim, sou filho de Deus, mas você também é", não é culpa minha se só ouviram a parte primeira. Estamos falando de um homem, carne e osso, e das ideias dele. 

É, as ideias. Ideias que percorreram dois mil anos de história, encerraram tantos outros anos de mitologia, criaram algo mais poderoso que a monarquia, se dividiram tanto quanto puderam, mataram tantos quanto não deveriam, queimaram tudo o que os ameaçava. 

Anh? O quê? Apenas uma história para crianças, o tal Jesus? Que seja. Então as ideias de um escritor franzino mudaram o mundo. Melhor que seja. 

Há um ponto na história que definiu todo o resto. Este é o ponto, ele é o ponto. E um ponto que não é só o cara de sandálias que impede as crianças de comerem sardinhas na Páscoa; "Ora, o que tenho a ver com isso, o que minhas sardinhas tem a ver com isso", diz o filho, no que a mãe vê o sacrilégio e vai até a cozinha, se abaixando, "este menino está endemoniado, acho que há um crucifixo aqui, em qualquer lugar, debaixo do fogão". 

Perguntar é ruim para pessoas que seguem um homem que questionou todo o resto. Cristo, se não é cristo e só é Jesus, é revolucionário. Anarquista? Regras? Dinheiro? 

Se ele realmente precisa, dê a César o que é de César. 

Não uma questão de atacar o consumismo, o capitalismo, os EUA, o imperialismo; isso é muito mais a procura da razão — a razão pela qual Jesus não saltou da cruz com seus poderes, criou garras de adamantium e estraçalhou os fariseus em pedaços. "Lavar as mãos é o caralho", e acabou-se Pilates. A mesma razão pela qual Sócrates tomou a cicuta, quem sabe. 

Enfim, faça o sinal da cruz e tenha uma razão para isso. Não um colete espiritual a prova de balas ou o que quer que seja, ou algo tão mecânico quanto escovar os dentes, "filho, reze quando acordar e for dormir. Senão papai do céu não gosta". Ah. Papai do Céu. Certo. Então tá bom. 

"Perdoa o povo aí, pai, eles não sabem o que fazem". Dois mil anos, anh, podemos agora tentar saber o que fazer, podemos, podemos?

segunda-feira, 17 de março de 2014

Fernão Capelo Gaivota, de Richard Bach

Ilusões, do mesmo autor, é um dos melhores livros em que já pus os olhos, tive de lê-lo duas vezes para absorver (acho) tudo o que ele tem a oferecer. É impressionante como Fernão Capelo Gaivota e ele se completam, sem necessitar um do outro. 

A resenha do Trunkael sobre este livro não faz jus à obra. Não quero superar o tal texto, mas já que ele tratou a história do ponto de vista mais conciso possível, vou tentar fazer o inverso. 

Segundo o prefácio de Ilusões, o autor não gosta de escrever e só escreve quando um boa idéia lhe pega pelo colarinho e o obriga a pô-la no papel. Fernão Capelo Gaivota, então, fora uma boa idéia. Mas, pense comigo: ele tem lá sua boa idéia para mostrar, mas ela poderia se tornar extensa demais, e isso retiraria a atenção de que precisa. Então, ele fez uma parábola pequena, a história de uma gaivota. 

Uma gaivota que não acreditava que todas as gaivotas nasciam apenas para comer e voar para pegar mais comida. Uma gaivota que queria aprender a voar. 

São demonstrados alguns conceitos: limitações são prisões que nos impomos, estamos aqui para aprender e alcançar a perfeição - fazendo aquilo que queremos fazer - e cada aprendizado é passo adiante para outro mundo onde se pode aprender mais. 

Um erro que eu acho que posso encontrar em quem lê, é por a história acima da Terra, acima do Sol, envolta em mitos. Se é uma parábola, se é construída de metáforas, então ela deve ser compreendida, e não tornada uma deidade.
  
Vocês podem fazer o que quiserem, contanto que se esforcem um pouco para isso; não conseguiam nem segurar o lápis quando começaram a aprender, e, quando conseguiram, viram que era fácil. Como um outro degrau de escada, como um outro mundo do texto. 

Vocês podem ser o que quiserem, são idéias perfeitas, e a sua imagem realmente fica fluorescente quando crescem; já disse alguém que você é o que os outros vêem que você é, e a criança do exemplo acima, que aprende a escrever, considera o pai um ser extremamente inteligente - e poder-se-ia dizer que ele brilha para ela. 

E mesmo que as outras gaivotas não compreendam, continue.

Helena, de Machado de Assis

A diferença deste livro do Machado de Assis para outros, como O Alienista e Dom Casmurro é gritante. Esses outros contam histórias, analisam personagens — param no meio da história e pensam a própria história. Helena ainda segue o Romantismo; endeuse uma mulher e que os outros personagens se agarrem às suas saias. 

Vai, não vou dizer que o livro é ruim. Ele é previsível, isto sim. Segue uma linha reta do começo ao final: o mundo ao redor de Helena, as coisas que a influenciaram e as coisas que ela própria influenciou. 

A história é simples: morre um homem lá e, em seu testamento ele reconhece uma filha que não era do conhecimento de ninguém. Esta é Helena. E ela vai morar na casa do irmão e de sua tia. 

Os personagens são estereótipos bem definidos. Há o padre de sabedoria enorme, o pai ambicioso da noiva deveras apaixonada pelas aparências, o escravo solícito... tem um amigo que chega de longe, pode adivinhar o que acontece quando ele chega para reencontrar o filho do homem que morreu? 

O autor deverá se revirar no túmulo após essa afirmação, mas eu aconselho a qualquer a preferir Coragem, o Cão Covarde ao livro citado.

quinta-feira, 13 de março de 2014

Convite à hipocrisia

Celebrem sua própria estupidez, e isso é tudo o que podem fazer. Isso é tudo? Abandonaram as próprias mentes na cabeceira da cama pelo simples fato de que os impediram de usá-la uma vez. Desistam, porque não há nada mais que possam fazer.

Pois não há educação que levará seus filhos ou vocês mesmos a lugar algum. Você vai morrer — e vai pro céu, pode acreditar, porque se Deus não te deixar entrar, o céu é capaz de falir. É simples. Nós fomos vencidos. Vencidos! 

Será que não pode entender a clareza de minhas palavras? O que éramos? Lutávamos por alguma coisa? Não mais, não mais. Nós não devemos questionar nada, devemos ouvir apenas, e obedecer. Não pergunte, apenas siga tudo o que lhe disserem. Não pense, deixe que pensem por você. Não viva bem e não se preocupe em ser feliz — apenas finja sê-lo, apenas finja viver bem — porque sua aparência é tudo o que mais importa. 

Eu te convido... você não precisa saber de nada. Não precisa de conhecimento. Queimem a sabedoria porque tudo o que importa é manter nossos corpos quentes e confortáveis. E quando lhes disserem para que sejam bons, apenas digam que serão bons e ignorem todos aqueles que sofrem, pois, de acordo com a imagem que deixou, você é bom e irá para o céu. 

Olhe para o céu e descubra finalmente que, quando chegarmos aos finalmentes, a Salvação se torna simplesmente o abandono dos próprios irmãos à morte. Sejam julgados e acreditem que tudo é maior que vocês, tudo é mais poderoso que vocês, e não há nada que você possa fazer, não há nada que você consiga mudar...nada...eu te convido, te convido para que mesmo que todo o poder de tua vida esteja em tuas mãos, crie desculpas para que o peso da responsabilidade não te atinja. Fuja da verdade, corra do simples odor de sua presença. Ela é perigosa e pode te destruir — conseguimos esmagá-la, e hoje uns poucos (que em breve estarão mortos) ainda persistem em usá-la. Mas tu não. Tu és mais forte. 

E, sim, em um mundo onde cores são importantes, e onde roupas dizem mais do que mentes, e onde idéias são lixo, onde as crianças aprendem desde de cedo que devem crescer, trabalhar, reproduzir e ensinar que seus filhos façam o mesmo antes de morrer, nós venceremos, nós que somos os personagens que criamos, nós que criamos a Moral que deixa nossos personagens viverem sem se esforçar... nós... e tu. Todos. 

Eu vos convido à hipocrisia. E então fingiremos ser irmãos até que nossos interesses mudem.

terça-feira, 11 de março de 2014

Encontros e Desencontros

Eu não queria ver Encontros e Desencontros quando vi o trailer ou quando vi o cartaz. Não me chamou a atenção. O que me levou a vê-lo, mesmo, foi a insistente opinião do Cinéfilos Online de que o filme valia a pena. 

É, ele vale a pena mesmo. Puxa vida, nunca julgue um filme pela capa, ou coisa que o valha.

A premissa é simples. São dois protagonistas, americanos, no Japão. Um deles, o homem, é um ator que está ganhando tantos milhões para vender uma marca de uísque. Em sua terra natal ele deixa alguns problemas coma família: um casamento praticamente falido, filhos que correm quando são chamados para falar com o pai ao telefone. O outro protagonista, a mulher, é uma garota, formada em filosofia, recém-casada com um fotógrafo, meio confusa, sem saber por que casou; na verdade, com quem casou. 

E o mais são uns cinco dias, acho, desde que eles se encontram. A história segue calma, ponto por ponto, e cada palavra do texto está lá com louvor. E quando não há palavras, quando você só observa os personagens em tal ação, ou quando eles não dizem nada, e consegue-se ler o pensamento na face do ator — anh, é impressionante o que filme consegue dizer mesmo quando não diz nada. 

Não entendo nada de fotografia, mas se entendesse, diria que são bem legais as cenas da garota encostada na janela do apartamento dela — sabe aquelas janelas que são quase como paredes? Então. Uma garota e o resto do mundo lá fora. Até a frase tem lirismo. A primeira cena do filme. Anh, não achei que alguém pudesse fazer aquilo sem que fosse engraçado. 

Bah, é bom. Bom mesmo, nada mais a dizer. Quero ver de novo.

domingo, 9 de março de 2014

Ensaios Impopulares, de Bertrand Russel

Anha, filosofia. 

Bom, isso não interessa a grande parte da população deste planeta e não vou fazer um discurso de defesa antes do post. Portanto, qualquer divergência, vá ler outro blog. De preferência, os linkados na esquerda. 

Bertrand Russel trata de diversos assuntos no seu livro. Acho que todos aqueles tipicamente tocados pela filosofia, e que a mim e ao Trunkael tem dado certo desgosto ultimamente. Algumas partes podem deixar perplexa uma criança desusadamente estúpida, mas ele até que é simples e fácil de se entender. Ele diz que às vezes é pedante por conta de que funciona. Seus exemplos até que lembram o Mero Cristianismo, se você ver por um lado. 

Hum, ele estabelece para a filosofia dois objetivos, ditos como únicos desde o começo: arranjar uma razão pra tudo o que está e arranjar um jeito decente pra se viver no que está aí. As coisas mudaram e as ciências dividiram tudo, e ele demarca para a ciência o pensar sobre o que sabemos e a filosofia sobre o que não sabemos que há. 

Nessa de arranjar o melhor jeito de viver aqui, ele diz que seria perfeito se toda a força militar do mundo fosse superada por uma só nação, ou concentrada em uma só aliança. Ele diz que por acordo isso não deve acontecer, e que seria aceitável se os EUA, por exemplo, dominassem o mundo.

Assim se impediriam guerras e em algum tempo a situação seria próxima a perfeição. 

Anha. Ele também repudia dogmas. Ele diz que esse é um erro fundamental, de todo tipo de coisa. Jogar um livro fora, por exemplo, como se ele fosse de todo errado, deixando uma idéia boa ali ir embora. 

Não vou tratar de tudo. Esse post ficaria enorme. Outros dias eu falo sobre outros elementos.

quinta-feira, 6 de março de 2014

agradecimentos e uba, uba, lelê.

Eu definitivamente não sei agradecer a presentes nem a elogios sem que o que eu disser me pareça, anh, falso, ou algo parecido. Não sei. Então, eu sempre considero mas mantenho o silêncio, e isso parece, anh, arrogante. 

Portanto, eu sempre agradeço todo elogio e presente, mesmo calado, e não sou arrogante, na maior parte do tempo.

Curto Conto

Há um casa flutuando no meio do universo. Há duas famílias na casa, e elas estão em guerra. 

Entretanto, a disputa está prestes a terminar, pois uma das famílias conseguiu uma arma incrivelmente poderosa. 

Diziam eles: 

"Ahaha!", e bebeu um gole do whiski, "Agora eles não poderão nos derrotar mais. Temos a mais poderosa bomba da história." 

"Sim, grande amigo!", e acariciou as pernas da bela prostituta, "Somos superiores, enfim!" 
"Uma bomba que pode devastar a casa inteira!", regorgizou-se outro. 

Então eles beberam e beberam, até que, em certo momento, um dos bêbados se levantou e, com um tom de inocência, perguntou: 

"Ei, a bomba pode mesmo devastar a casa inteira?" 

"Mais do que isso. E temos cinco delas", e coçou a cabeça, percebendo que havia vômito nela. 

"Mas... tipo...", disse o bêbado, e agora notou que seu pé estava no vômito também, "Nós não estamos na casa também?" 

Por um momento a sala de bêbados pareceu ouvir, e houve silêncio.

A Vaca de Bertrand Russel

Eu vou fazer uma resenha do Discursos Impopulares do autor citado acima algum dia próximo, mas tenho que parafrasear o exemplo da vaca antes disso. Então, aí está, o exemplo da vaca:
Quando passamos de trem por um campo em que há vacas pastando, podemos ver, às vezes, que elas fogem aterrorizadas à passagem de um comboio. A vaca, se fosse um metafísico, arguiria: "Tudo em meus próprios desejos, esperanças e receios se refere a mim mesma; concluo daí, por indução, que tudo no universo se refere a mim. Este trem ruidoso, portanto, pretende fazer-me bem ou mal. Não me é possível supor que ele pretenda fazer-me bem, já que aparece de maneira tão aterradora, e, portanto, vaca prudente que sou, procurarei escapar dele". E um trem que lhes fosse indiferente, que não intencionasse fazer-lhe bem ou mal, deixaria a vaca metafísica perplexa, com algo tão fora do natural.

quarta-feira, 5 de março de 2014

Lucas Ricardo

Uma história típica de filme de guerra. 

Lucas Ricardo era um herói da revolução. Ah, a revolução. Hoje, nenhuma pessoa se lembraria da revolução, exceto alguns historiadores obcecados, mas fora importante, e mudara a vida de centenas, milhares, bilhões de pessoas. E isso, se pararmos pra pensar, é bastante óbvio, senão não haveriam obcecados no assunto. 

Ou talvez houvesse. Existem obcecados por qualquer coisa, vai saber. 

O nosso soldado, Lucas Ricardo, era moreno, robusto, e, se estivesse vivo hoje, possuiria um número impressionante de cicatrizes. Marcas de guerra, seus troféus pessoais. Ele se orgulharia dos machucados antigos, assim como se orgulha dos seus bigodes, dos seus tênis Nike e do seu boné da Adidas. 

Diziam que ele se orgulhava tanto dos tênis que, na derradeira batalha da revolução, abandonou os coturnos e os vestiu, logrando vitória. E, dizem também (as pessoas realmente dizem coisas pra caramba) que, nas trincheiras, sob a luz do luar, enquanto alguns tocavam gaita e choravam, ele apenas punha sobre a cabeça o seu boné, e assim encontrava a paz. 

Lucas Ricardo, antes da guerra, trabalhara por demais. Fora ajudante de pedreiro, alfaiate, marceneiro e gandula. Vendera doces em ônibus e em meio de avenida, fizera exatamente cinco cursos profissionalizantes e começara a trabalhar em manutenção de computadores de dia, enquanto fazia telemarketing a noite. Dez anos depois ele tinha sua própria loja e um apartamento. Fez festa, ficou feliz e bebeu até cair. 

Dois dias depois a revolução começou e ele foi chamado, indo alegremente para a batalha.

O soldado tinha um tique nervoso que ficou evidenciado em uma das setenta e duas vezes em que foi capturado pelos inimigos (tendo conseguido fugir de todas após alguns ferimentos leves, e muitos outros graves). Coçava a orelha compulsivamente, e sempre seus dedos estavam amarelados. Lucas Ricardo era chamado de Dedos Amarelos no Gatilho. 

Ele foi chamado assim cerca de duas vezes, pois é um apelido bem grande. 

Tendo passado o tempo, em seu ardor de servir a nação, Lucas Ricardo cansou-se. "Foda-se tudo", ele disse. Poucos sabem, mas foi assim que se tornou herói de guerra: o grupo revolucionário estava sendo encurralado em um trem, e nosso soldado disse: "Vou sair e derrotá-los, não precisam esperar".

Por ventura, algum idiota explodiu uma bomba próxima demais de seu próprio grupo, e os revolucionários se viram ganhando. A ventura foi atribuída a Lucas, e ele seria louvado como herói, como eu disse, se não houvesse sido capturado pela septuagésima-terceira vez. Um soldado anti-revolucionário se viu perdendo e quis levar alguém preso. "Um otário eu levo", é o que os livros registram como tendo ele dito. 

O soldado herói apanhou, apanhou mais, quase foi afogado, arrancaram-lhe as unhas, quase foi afogado de novo e apanhou de novo. Mas Lucas Ricardo era homem de sorte, e acabou fugindo. Quando ele acordou, viu-se em frente a uma enfermeira de grupo amigo. 

Ela tinha cabelos curtos e uma verruga no nariz. E o primeiro pensamento de Lucas Ricardo foi: "Eu preciso fazer sexo".

Então, eles se casaram e foram felizes.

domingo, 2 de março de 2014

A Tentativa Incessante

Há um rato e uma gaiola no meu quarto. O rato tem um companheiro de cela, mas o companheiro não é importante. 

Olhe para o rato. Não se avexe, olhe o rato. Ele fica lá, dia após dia, a escalar certo ponto da gaiola e morder o metal. Ele morde e morde e morde sem parar. Em sua crença, o metal se dobrará entre seus dentes. E no dia em que conseguiu abrir a portinhola de saída e correu pelos campos ermos que eram o piso do meu quarto, aquela pressão que nunca sai dos ombros dos presos estava nele. 

O rato foi pego e posto de volta. Ele volta a roer o metal. Seu companheiro às vezes faz o mesmo: deve considerar que é o certo. 

E toda vez que vêm para alimentá-lo, o rato se posiciona, espera um erro, um momento de descuido. Em seus olhos, naquele brilho no olhar — vamos, olhe para o brilho — pode-se ler: go ahead, make my day

E a comida vem e a gaiola se fecha, e o rato volta a roer sua prisão.

Dia Santo, de Humberto Batista Leal

Não é um livro extenso, não é um livro complicado de ler e não é um livro de um escritor famoso. É o primeiro livro de escritor brasileiro, pelo menos para mim, desconhecido. Diz o prefácio que o primeiro livro dos escritores tem algo de melhor ante os outros: é tudo aquilo que o escritor juntou, aquilo que sempre quis escrever. Uma esperança só - o balde furado do post acima

É uma arca de histórias. É o que se propõe a fazer, e faz bem. A descrição dos fatos e lugares não é perfeita; é apenas bastante. Um rascunho de realidade, e aí ele joga o enredo e tudo o que se precisa. Os personagens vivem e morrem e dão origem a outros personagens. A Via Crucis metafórica, passada na Amazônia, num lugar no meio do nada chamado Maciriguei. 

É uma história sobre vida e morte, antes da vida e além da morte. É uma história sobre deuses, lendas, modos de viver e razões para morrer. Posso comparar a história a Deuses Americanos, pelo modo como trata as lendas. Posso comparar a Cold Mountain, pelas guerrilhas, pelas revoluções, pelos amores, apesar dos amores aqui serem mais intensos e consideravelmente curtos. Mas não vou comparar com coisa alguma. 

A resenha de Deonisio da Silva nas costas do livro diz certo efeito gerado como apenas um efeito, mas creio que é regra: você não pode descrever o livro com perfeição sem contá-lo, sem passá-lo a frente. É como talhar algo sem forma, é como tentar explicar a história que sua avó te contava antes de dormir sem dizer as tais histórias. 

O livro se completa e se sustenta sozinho e, mesmo não querendo fazer comparação, é melhor do que todos os livros de Paulo Coelho que já li.